“Confiamos na idoneidade mental do negro, e acreditamos na reinvenção de nós mesmos e da nossa história. Reinvenção de um caminho afro-brasileiro de vida fundado em sua experiência histórica, na utilização do conhecimento crítico e inventivo de suas instituições golpeadas pelo colonialismo e o racismo. Enfim reconstruir no presente uma sociedade dirigida ao futuro, mas levando em conta o que ainda for útil no acervo do passado”.
ABDIAS DO NASCIMENTO
Após a instituição de políticas de ações afirmativas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 2012 - políticas essas frutos de uma intensa peleja de movimentos negros -, assistimos a uma perceptível mudança no perfil de universitário da UFRJ, especialmente no curso de História. Entretanto, negro na academia não é um fenômeno inédito: antes dessa geração, houveram memoráveis intelectuais que nos “prepararam o terreno” e já nos indicavam o quanto o trabalho intelectual pode contribuir na agência por emancipação política e econômica da população negra. Infelizmente, poucos dessas personalidades estão vivas para nos contar, em primeira pessoa, suas vivências e “sofrências” universitárias.
Passados cinco anos de implementação das cotas sociais e raciais na UFRJ, algumas ausências se mostram nítidas. No curso de História, o currículo eurocêntrico, a precariedade da assistência estudantil, os poucos (embora extremamente representativos) professores negros são alguns dos aspectos que constituem o balaio do racismo institucional e epistêmico que estudantes negros encaram na universidade.
Apesar da falta de políticas que objetivem a permanência plena desses alunos (a UFRJ não possui sequer dados de rendimento e evasão de seus cotistas), também assistimos mobilizações coletivas de estudantes negros em prol da garantia de que essas novas experiências universitárias não se dispersem ao longo do tempo. Uma dessas mobilizações ocorreu entre os dias 16 e 20 de outubro deste ano no Instituto de História (IH) e no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS). A Jornada Afro Acadêmica de Estudos (JAAE) foi uma ação com a finalidade de propiciar trocas de experiências acadêmicas de universitários negros espalhados por todo país. Por conseguinte, foi possível, durante a semana da jornada, conferir a riqueza das produções intelectuais que tem sido provocadas por negros na academia.
A Jornada provou o quanto a diversidade é um fator que só valora a academia. A UFRJ só tem a ganhar com a diversidade em suas salas de aula. A Jornada provou também a necessidade da produção “de uma ciência para e não tanto sobre o negro”, conforme já nos alertava, lá em 1977, o sociólogo Eduardo de Oliveira e Oliveira, que em seu artigo homônimo atenta para a falta de pragmatismo de algumas produções. Eduardo frisa que ciência precisa ter caráter propositivo, principalmente a ciência desenvolvida pelos intelectuais negros. Ciência propositiva é a base para o desenvolvimento de políticas públicas sólidas que podem contribuir com o fim das mazelas que a população negra se depara no Brasil.
E quanto à onda negra na academia nos últimos anos: não tem mais volta.
*Gabrielle Abreu é graduanda no 7º período em licenciatura e bacharelado em História na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - previsão de formatura em 2018.2. Estagiária no acervo audiovisual da Roquette Pinto Comunicação Educativa. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID). Membra do Comitê Editorial da Revista Outrora. Componente do Coletivo Negro Carolina de Jesus. Interessa-se por estudos em relações raciais, história dos movimento negros, intelectualidade negra e história contemporânea do Brasil.
Comments